Pensamentos Prensados

quarta-feira, maio 09, 2007

Fila de banco (gaveta II)


Besteiras escritas para aula de Contos II.


A preguiça nas férias foi tão contagiante que só consegui observar uma fila de banco na quarta passada, 7 de fevereiro. Já tinha tentado fazer isso em duas ocasiões anteriores, mas fracassara, pois escolhera horários “ruins”, em que praticamente não havia fila.

Resoluto, parti para uma nova tentativa na agência do Banco do Brasil que fica próxima à Biblioteca Central, na data acima mencionada, por volta das 12h30. O local estava bastante movimentado; mais do que uma fila, havia três para minha felicidade: a do saque (sempre a maior de todas), a do depósito e ao do cheque.

Sentei-me em uma das cadeiras e percebi que não estava tão próximo assim das filas e não poderia observá-las com tanta precisão; por outro lado, eu tinha uma visão geral da agência, tanto do setor de caixas eletrônicos quanto da rua. E isso me ajudou a presenciar várias cenas interessantes.

A primeira delas foi um senhor barrigudo, que vestia uma camisa esquisita da seleção brasileira de futebol; só não era mais bizarra que a usada pelo Dunga na véspera, quando o time perdeu para Portugal. Para me refazer do susto, acalmei-me vendo várias garotas, umas com minissaia, outras com calça de ginástica (tinha até mãe e filha assim). Enquanto registrava estas informações relevantes no meu caderno, a mulher ao meu lado tentava espiar o que eu escrevia. Se conseguiu, deve ter ficado horrorizada.

Meu deleite prosseguiu com a chegada de uma loira de top verde, bronzeada e de pernas torneadas, e duas alunas da Odontologia. Uma delas, uma loira igualmente bela, entrou só para acompanhar a amiga que foi sacar. Sem vaga no banco de três lugares (antes do cavalheirismo vinha o trabalho), ela desfilou por alguns instantes na agência antes de parar ao lado da porta. Ficou mexendo na bolsa e observando o movimento na rua; a amiga retornou logo, reclamando dos valores disponíveis no caixa.

E eis que outra loirinha, da Farmácia (viva o CCS!), entrou. Vestidinho branco, nariz empinado e sortuda: conseguiu uma caixa rapidamente. Admirava-a quando uma senhora arrancou-me de meus devaneios para perguntar onde ficava a fila (!). Presumi que fosse a do saque e para lá apontei. Logo depois, veio uma moça morena que ficou cinco segundos na fila e foi embora. Esquizofrenia absoluta.

Meus olhos, ávidos, voltaram-se para loirinha, mas ela já estava saindo. Um rapaz com bermuda de surfista, que acabara de fazer um depósito, secou-a descaradamente, muito menos discreto do que eu. Como não havia mais beldades, passei a ouvir a conversa entre dois conhecidos, um homem e uma mulher, na fila do cheque. Falavam sobre trivialidades; ela, loira (outra) de vestido verde-claro, se despediu com um “tudo de bom” e partiu para a requisitada mesa dos formulários para depósito. E, sabe-se lá como (pois eu não vi), ela saiu com uma laranja na mão!

Olhei para o relógio. 12h42. A agência esvaziou um pouco e, para minha alegria, apareceu outra moça bonita, desta vez uma estudante de Jornalismo. Nunca a tinha visto antes; era caloura e chamava-se Rafaela, dizia a bolsa dela. Na seqüência, mais uma loira! Usava também um vestido verde-claro e pensei que fosse a mesma de antes, mas não, essa era mais jovem.

Com menos pessoas no local, o barulho intermitente do aparelho de ar-condicionado irritava mais, parecia uma tobata. Entediado, passei a observar a rua. Muitas pessoas voltavam do almoço e se dirigiam ao campus. Vi, inclusive, seis alunas maravilhosas do CCS na calçada da biblioteca, sorridentes e distantes, rindo sem parar. Infelizmente elas não vieram para a agência, que pulsava de novo com a chegada de mais pessoas e o desenrolar de um suspense.

“Onde fica o CTC?”, perguntou uma mulher de uniforme (adivinhem a cor do cabelo dela), funcionária da empresa Gertis, para a fiscal do banco. “É muito longe?”, questionou em seguida. Mesmo pegando a conversa pela metade, compreendi que havia algo de errado. Olhei para esquerda e vi que o único caixa eletrônico disponível para serviços de cheque não estava funcionando. A loira, indecisa (ou com preguiça de ir até o CTC), sentou-se, à espera de uma solução rápida.

Nesse ínterim, a agência lotou novamente – oito pessoas entraram de uma vez só e a fila do saque alcançou a porta. Um alarme falso soou: alguém imaginou que o caixa do cheque tivesse voltado a operar, mas foi só a tela que ligou. Desolada, a loira do Gertis continuou a esperar.

Para piorar a situação dos ouvidos sensíveis, uma britadeira começou a ressoar, reiniciando as obras no banco. Os borburinhos das pessoas e o ar-condicionado a acompanhavam. Em meio a essa orquestra dissonante, uma moça morena, magra e bonita, com uma sacola do Comper repleta de iogurtes, pediu ajuda à fiscal. Ao saber que o caixa do cheque estava inoperante, saiu decidida em direção ao CTC.

Eu parti logo depois, sem saber o destino do caixa e da loira do Gertis, tampouco o tempo que as filas levaram para se desmanchar por completo. Minha fome prevalecera.